27.12.07

Oficcina Multimédia: 30 anos



O grupo Oficcina Multimédia de Belo Horizonte comemorou seus 30 anos lançando um livro com registros da sua trajetória. O livro tem a autoria de Ionde Medeiros, uma das fundadoras do grupo e encenadora.

Os registros do Oficcina Multimédia constituem uma contribuição muito importante para a história das artes cênicas no Brasil. Principalmente pelo fato de ser um grupo de vanguarda, pioneiro em Belo Horizonte quanto ao experimentalismo, incluindo a contaminação entre linguagens artísticas, as criações híbridas e, por fim, devido à radicalidade de sua poética de encenação. Por muito tempo o Oficcina foi marginalizado, considerado hermético, mas a persistência de Ione Medeiros, sua dedicação e sensibilidade, aliada à sabedoria de dar espaço para a autonomia de performers jovens e corajosos, consolidaram uma linguagem e um modus operandi em pesquisa e criação cênica.

Qual o segredo do Oficcina Multimédia?

De modo ligeiro:

a) a trajetória que começa, de um lado com o músico e compositor argentino Rufo Herrera, que já havia desenvolvido, nos anos 70, um Laboratório Multimédia;

b) de outro lado, com Berenice Menegalle, que havia criado a Fundação de Educação Artística de BH (o Oficcina nasceu ali dentro e é uma extensão da instituição), que por sua vez já sofrera nas pesquisas de iniciação e formação musical as influências do músico e compositor Koellreutter (que difundira no Brasil o experimentalismo e o caráter de laboratório de criação);

c) o trabalho corporal de Mônica Ribeiro, voltado para um espaço entre dança e teatro, configurando uma energética pulsional do movimento, uma rítmica que formou as bases do treinamento do grupo;

d) a dimensão musical acurada e associada a uma enorme sensibilidade plástica (Ione sempre estudou artistas plásticos junto com o grupo para suas montagens, sem falar na pesquisa e design de objetos de cena, cenário e figurinos).

E o que mais?


Melhor é ler o livro.


Referências e outras informações:

MEDEIROS, Ione. Grupo Ofcicina Multimédia: 30 anos de integração das Artes no Teatro. Belo Horizone: I.T. Medeiros, 2007.
Imagem: Espetáculo Acusação - foto de Glênio Campregher
E-mail: contato@oficcinamultimedia.com.br

24.12.07

Assis Valente: felicidade é brinquedo que não tem...



Então, é Natal. Não fosse a cisão que atravessa nossas sociedades (de mercado), seria um ritual ou um costume, ou algo assim. Mas não é disso que se trata. Comemora-se, não se sabe bem o quê... Nem todos os grupos humanos comungam com a idéia de Natal, mas quase todos estão submetidos à civilização ocidental-cristã e suas mutações. Por exemplo: uma comemoração religiosa transformar-se num grande mercado mundial!

Um de seus subprodutos foram as músicas natalinas. Porém, nem sempre os requisitos da encomenda, entre eles o de embalar as consciências,foram atendidos. Assis Valente, o pré-socrático do morro, como dizia Jorge Mautner, fez outra coisa, completamente diferente: abriu a nossa ferida. O genial compositor que tentou suicídio três vezes e viveu oprimido pela sua ambiguidade sexual, apaixonado por Elvira Pagâ e depois por Carmem Miranda, compôs sua canção natalina, fugindo dos estereótipos:

Anoiteceu, o sino gemeu
E a gente ficou feliz a rezar
Papai Noel, vê se você tem
A felicidade pra você me dar
Eu pensei que todo mundo Fosse filho de Papai Noel
E assim felicidade
Eu pensei que fosse uma
Brincadeira de papel

Já faz tempo que eu pedi

Mas o meu Papai Noel não vem
Com certeza já morreu

Ou então felicidade
É brinquedo que não tem


Quando eu era menino, eu ouvi isso no rádio e tomei consciência, pela primeira vez, de que o Natal não era para todos... O rádio era assim, conectava-nos com um ausente-presente, introduzindo uma voz na paisagem do interior de Minas Gerais. Aquilo mexia comigo. O drama sacudia o universo da vida comum, desequilibrando o céu que nos protegia.

Em outras palavras, Assis Valente expõe nossas delusôes , para fazer uma conexão com o Budismo.

Assis, o Valente, cortou os pulsos e não conseguiu morrer, pulou do Corcovado e figou enganchado numa árvore e por fim, numa tarde de 1958, tomou formicida com guaraná enquanto crianças brincavam em volta, numa praia.

Augusto de Campos montou o seguinte paradoxo para falar de Assis Valente e de sua obra: o felicídio da suicidade. Com isso, Augusto mostra que a poética nem se ampara num sentimento e nem retrata objetivamente o real, produzindo antes o impensável (na trilha de Deleuze). Se fosse a felicidade do suicídio ou o suicídio da felicidade teríamos dois retratos, um subjetivo e outro social. Ou, dito de outro modo, um niilismo e uma sociologia.

O Valente Assis viveu a plenitude do paradoxo. Que não tenha sobrevivido às suas questões, não é um julgamento, mas a constatação de que os seus tempos foram difíceis e muitas vezes há o suplício misturado ao canto. A vitoriosa Carmem Miranda, que se incomodava com a acidez e com a ironia lúdica dos versos de Assis, no momento de sucesso nos EUA, também foi ao chão, dia após dia, explorada pelo próprio marido e produtor.

Nem niilismo romântico e nem objetividade discursiva nos salvará - talvez essa seja uma das mensagens de Assis, o Valente. Aliás, um dos versos mais geniais é puro paradoxo-zen:

"sapateia na poeira sem pena
sem dó
a poeira é aquele que sapateou até virar pó"
.


Referências:

MpbNet - Assis Valente


9.12.07

Zikzira Teatro Físico: Eu vos liberto



Zikzira Teatro Físico traz um novo espetáculo: Eu vos liberto. Montado numa antigo depósito de tecidos, o 104 da Praça da Estação, em Belo Horizonte, o espetáculo abre uma zona sombria e espectral, configurando o cenário decadente de um palácio. A encenação tem por base a tragédia de Euclides, Hipólito, na qual Fedra vive o tormento de uma paixão incestuosa.

Fernanda Lippi e André Semenza, responsáveis pela criação corporal e cênica, respectivamente, continuam com a busca por um teatro físico visceral e, de certo modo, espectral. Acrescentam, para quem viu o filme As Cinzas de Deus e o espetáculo Verissimilitude, a vocalização. Em Verissimilitude, a vocalização se dava em pouquíssimos momentos, em sons inarticulados, que não remontavam a uma significação, deixando-nos num plano de sensações. Agora, o Zikzira Teatro Físico, após suas experiências com as vocalizações a partir das técnicas de Grotowski, arrisca-se no terreno de um oralidade mais explícita quanto à significação do texto.

Retomo alguns pontos. A questão do espectral: vejo que o teatro físico alimenta-se dos estados corpóreos, configurando mais espectros do que personagens dramáticos ou épicos. A figura, tão cara para uma arte narrativa e de conexões lógicas de significação, é des-figurada. Não pelo mergulho psicológico (teatro dramático moderno norte-americano, por exemplo, onde, em Longa Jornada Noite Adentro as personagens se desmancham, mas a representação está firmemente alicerçada em cena), ou mesmo épico-narrativo, com os seus enunciados discursivos diretamente para o público, mas sim porque o estados corporais e os desenhos intensivos tomam a composição cênica. Deleuze fala de uma lógica da sensação, quando aborda a pintura de Francis Bacon. Por ressonância, penso que os espectros do teatro físico, como o Zikzira desenha, aparecem primeiramente como figuras, mas são tomadas por forças desfigurantes. Deleuze diz que “em arte, tanto em pintura quanto em música, não se trata de reproduzir ou inventar formas, mas de captar forças”. Ele cita a fórmula de Klee: “não apresentar o visível, mas tornar visível”. E o que o teatro físico e pós-dramático realiza não é a figuração das personas, mas sim as forças invisíveis que atravessam os corpos.

Matteo Bonfitto faz uma distinção entre os actantes máscara, de um lado, e estado e texto, de outro. No primeiro caso, temos uma ação que informa sobre o ontem e o hoje da personagem, numa linha que Matteo Bonfitto chama de temporalização. Há uma relação de causalidade: o que o personagem faz informa sobre seu passado e cria uma tensão em relação ao seu futuro – entra-se, portanto, num plano de coerência e de lógica.

Quando, ao contrário, se entra no actante-texto ou no actante-estado, o agenciamento é outro. Nesse momento, Bonfitto diz que ocorre uma destemporalização da personagem. Aqui, diz Bonfitto, o actante espacializa-se. Ou seja, ele não se encontra consubstanciado num sujeito psicológico. Torna-se impossível encontrar ações que sejam funcionais para o desenvolvimento dramático. Não há mais meios, diz Bonfitto, que possam identificar em tal ser ficcional uma estrutura lógico-temporal. Ocorre uma dispersão do personagem – o encadeamento lógico-causal, próprio do drama, se frustra.

O elenco, com performers de várias nacionalidades (brasileira, argentina e coreana), mergulha nesse mundo espectral e nos remete às forças invisíveis. Estão comprometidos com a linha das sensações que perseguem durante todo o espetáculo. E isso é muito bonito de se ver.

Fernanda Lippi mostra, assim, que continua com sua busca por uma linha pulsional, de uma coreografia energética. Não se trata mais de dança, moderna ou contemporânea, apesar do universo que baila diante de nossos olhos. Essa é uma dança que se dá antes de modo mais intensivo e menos extensivo.

Quanto às vocalizações, em vários momentos sou afetado pela mesma viagem espectral e desfigurante das forças que tomam os corpos. Fernanda Lippi e André Semenza estão introduzindo, cada vez mais, as vocalizações nas criações cênicas do Zikzira. Tais forças sonoras resultam também de impulsos corporais, numa busca que parece partir dos ensinamentos e procedimentos de Grotowski. Eu vos liberto traz, além disso, outros planos vocais, como o cantor lírico sobre uma ponte acima dos atores.

São expressões vocais que viajam mais no plano das sensações do que das significações, o que me evoca a característica espctral do teatro físico que o Zikzira tem configurado.

No entanto, há um componente de representação na vocalização do papel de Hipólito, por exemplo, que me remete a um teatro no qual a figuração da fala é explícita e dada à significação, apesar do delírio que o plano ficcional nos arrasta. Explico: a fala em alguns teatros dramáticos ou épicos são igualmente capazes de produzir afecções poderosas, mas o aspecto representacional está lá, com a figuração (o personagem ficcional com sua história configurando uma persona no teatro dramático ou o mesmo pronunciando um discurso, apresentando um mundo, como ocorre no teatro épico).

Arrisco um pensamento: o texto épico ou dramático contém elementos de significação da ordem da figuração. Neste, as forças invisíveis estão em contato com as forças visíveis (o que é dito como confissão da personagem ou como expressão de um mundo objetivo), mas predomina o plano no qual o texto se impõe aos outros sentidos da cena (e o sentido deriva, afinal, do texto literário). Ora, Eu vos liberto busca outro plano (o das sensações) e, ao mesmo tempo, introduz o texto que traz sua carga de significação. São perguntas que me faço: o lugar do texto falado no teatro físico. O grupo Zikzira, agora introduzindo vocalizações provenientes de um texto épico/dramático, abre essa trilha de investigação.


Referências:

BONFITTO, M. O ator compositor. São Paulo: Editora Perspectiva. 2006
DELEUZE, G. Francis Bacon - Lógica da sensação. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Editora.2007

Imagem: André Semenza - divulgação

2.12.07

Serras da Desordem - de Andrea Tonacci (2006)



Serras da Desordem, de Andrea Tonacci (2006), está nos circuitos de cinema. Uma obra do diretor do já clássico "Bang Bang" (1970), um filme essencial do cinema marginal, ou mais propriamente, como queria Jairo Ferreira, cinema de invenção.

Leonardo Mecchi, na Revista Cinética aponta para a "mistura singular entre o registro documental e ficcional, a utilização dos próprios personagens na reencenação de sua história (ecos tardios de Robert Flaherty?), os planos-seqüência dilatados no registro da vida primitiva, as seqüências de montagem e sobreposições de imagens, tudo colabora para uma experiência de imersão nesse registro audiovisual."

Tonacci ficou fora do Brasil por muitos anos e esteve filmando para as comunidades indígenas dos EUA. Fica evidente, em Serras da Desordem, seu olhar etinográfico. Mais do que isso, o filme traz as forças do cinema-linguagem de Tonacci. Ele não se prende a um discurso de retratista, antes fabricando, na indistinção entre ficção-documentário, a realidade própria do cinema. O território que o filme define nos coloca dentro, mais uma vez, nas trilhas que produzem o real, no sentido de capturar os momentos de extratificação: expropriação de vidas e significados, de riquezas e qualidades. O tempo todo, cortam trilhos e estradas, surgem cercas e desmatamentos, um indíviduo escapa e é recapturado incessantemente. Aqui, a arte não é um retrato do social, mas implicação de matéria e expressão.

Prestem atenção nos olhares da câmera de Tonacci nas seqüências em que Carapiru reencontra seu povo: são esses detalhes que escrevem as cartografias natureza/sociedade, apresentando nossos impasses. Não são imagens que representam esses impasses, mas que os expõem. No final, só posso dizer que preciso rever este filme contundente: um estudo de composição.

19.11.07

Ars Industrialis: uma ecologia do espírito

O site Ars Industrialis, em francês, com versão para o inglês, espanhol e alemão, convida-nos a pensar a submissão das tecnologias do espírito às forças do mercado, nas sociedades de controle (Deleuze). Esse é "um controle e manipulação dos desejos de indivíduos e grupos, de suas verdadeiras possibilidades existenciais, daquilo que somente existe como singularidades."

Ars Idustrialis tem por referência o pensamento do pensador francês Bernard Stiegler, diretor do departamento de desenvolvimento cultural do Centro Georges Pompidou, filósofo e doutor do Collège international de philosophie, professor da Université de Campiègue, e diretor de pesquisa da Connaissances, Organisations et Systèmes Techniques, e diretor adjunto do InstitutNational de l'Audiovisuel, puis directeur de l'IRCAM. No Brasil, temos a coletânia de textos de Bernard Sitegler (1) organizada e traduzida pela pesquisadora em performance art, Maria Beatriz de Medeiros, do Grupo Corpos Informáticos. Veja, também, a resenha de Priscila Arantes sobre o livro de Sitegler, na Revista eletrônica Polêmica Imagem número 21.

Stiegler discute a arte no viés das sociedades hiperindustriais, das singularidades, do controle e exaustão da libido dos indivíduos e grupos, e das estratégias de liberação.


Referências:


(1) MEDEIROS, Maria Beatriz de (orga. e trad.). Bernardo Stiegler - reflexões (não)contemporâneas. Chapecó: Argos, 2007
_____________________. Aisthesis - estética, educação e comunidades. Chapecó: Argos, 2005.
ARANTES, Priscila. Miséria afetiva, ou como os meios de comunicação liquidam o indivíduo. In: Revista Polêmica Imagem, número 21. Rio de Janeiro: UERJ, julho/setembro de 2007.

Site de Katie Duck: dança improvisacional




Katie Duck, performer de dança improvisacional e coréografa colocou no ar seu novo site. Katie esteve no Brasil em diversas ocasiões ministrando oficinas de improvisação e composição. No site há textos que abordam desde aspectos da história da dança contemporânea, na conexão Reino Unido/EUA, até informações sobre os procedimentos compositivos de Katie Duck. Chamo a atenção, particularmente, para um vídeo em que ela dança uma suite de Bach: sobriedade de linhas e precisão.

Alguns podem pensar que os procedimentos compositivos de dança pesquisados por Duck são utilizáveis somente em dança - grande engano. Até porque, numa perspectiva de obras híbridas e espaços entre, não se trata mais de pensar em linguagens isoladas. São poéticas do movimento-corpo-som-imagem.

Para as minhas pesquisas de treinamento em e como criação, extraio dos toques de Katie, dois procedimentos básicos, entre outros: a) aprender a compor através do sair, do deixar, do retirar-se do jogo cênico; b) a distinção entre escolha (choice) e acaso (chance). Não se trata de regras e improvisação - porque, aqui, estamos não no campo da estrutura, mas das forças em interação. São procedimentos técnicos que impulsionam os peformers da criação corpórea a um exercício sóbrio e livre ao mesmo tempo. A precisão é o intervalo de uma velocidade e não uma coisa dada e conferida por alguma autoridade (estética ou que seja).

A utilização de acasos (ecos de Cage) aparece, ainda, como ferramenta importante para a improvisação. No entanto, em busca da mudança, que é necessária, passamos a fazer escolhas sem a criação de um plano de imanência: um plano de escuta do espaço da atuação. Por outro lado, Duck mostra que, paradoxalmente, somente podemos ter acesso aos acasos através de escolhas. Mas, ainda, trata-se de perceber o que está emergindo no campo.

E no caso de compor com a saída, este é um exercício de grandes potencialidades. Os performers aprendem o desapego e, o que é vital, o retorno para o vazio.

21.10.07

Zikzira Teatro Físico: novo espetáculo e novas pesquisas

A Cia Zikzira de Teatro Físico está com estréia prevista para Novembro, em Belo Horizonte. André Semenza e Fernanda Lippi, fundadores da Cia, estão há meses imersos no processo de criação do novo espetáculo. Os dois artistas estão, ao mesmo tempo, ministrando oficinas no Projeto Laboratório: Textualidades Cênicas Contemporâneas - da linha de ação Arte Expandida - experimentação nos teatros da Fundação Municipal de Cultura de Belo Horizonte. A seguir, uma entrevista com Fernanda Lippi sobre os novos rumos da pesquisa da Cia.

Percebe-se, nas oficinas realizadas no Projeto Laboratório, que você está buscando, cada vez mais, uma conexão com a voz. Como você vê isso na trajetória da Cia?

O processo que a Cia vem se deparando nos últimos anos tende a nos fazer ficar, a cada dia mais atentos às vibrações que percorrem um corpo, atravessando os órgãos e servindo de instrumento para este mesmo corpo; compondo através de uma linguagem própria uma moldura para aprofundar a proposta estabelecida pelo próprio artista e aquele que o dirige. Acreditamos que ao investigarmos em corpos distintos vários estágios desta vibração, uma possibilidade de pesquisa irá se manifestar fora do corpo. Os ruídos oriundos deste corpo seriam a primeira manifestação, levando-no a outras manifestações sonoras, permeando melodias, até o aparecimento da voz.

Na busca de um corpo que se move, de um corpo que pulsa, segundo suas próprias palavras no Laboratório, como você vê o campo de desenvolvimento das técnicas de um teatro físico? Há um saber de corpo específico?

Acredito que todos aqueles que se propõem à uma escuta através do corpo, que direcionando este, à uma busca interior, através do aparecimento de uma verdadeira pulsão, este corpo terá uma necessidade de aprofundamento e busca de uma técnica que possa ser utilizada como ferramenta, a fim de alcançar um estado onde o corpo domina a mente e a sensação de liberdade possa emergir.

Mas para isso deve sim existir uma direção clara que possa propiciar o acontecimento do corpo, liberando o saber do corpo especifico e podendo assim repetir a vivência. Hoje, no Brasil, o teatro físico não possui uma única voz, a dança a mímica e o próprio teatro expressam que tudo que se move é físico e ainda mais as interdisciplinaridades, quando estas completam para criar um corpo manifestando-se através da fisicalidade.

Que fisicalidade e essa? Qual é o ponto de partida? Esse ponto de partida foi criado por uma necessidade estética? Muitas vezes, no Brasil, devido a nossa realidade, o ponto de partida de um corpo vem da necessidade externa de viabilização de uma obra. Isso muda tudo... No campo de desenvolvimento do teatro físico existem varias vertentes, e em um país como o nosso, as manifestações ocorrem de acordo com a realidade de cada região; infelizmente a formação dos nossos profissionais ainda é precária e quase escrava do sistema, mas acredito que qualquer ser humano que se propõe à uma escuta tão especial tem a possibilidade de descoberta, e o desconhecido gera muitas coisas.

E o novo espetáculo?.

Convido à todos aqueles que se interessam pelas várias facetas do ser humano e como ele pode se manifestar, carregando séculos e séculos de repetidos dramas. Sob pressão o verdadeiro caráter é revelado. Este projeto deu fruto á um longa-metragem e á um espetáculo ao vivo.

Imagem: As Cinzas de Deus - filme da Cia Zikizira Teatro Físico -

17.10.07

Do Teatro Pós-Dramático e das Dramaturgias Híbridas




A revista da Editora da UnB, Humanidades, publicou uma edição especial sobre o Teatro Pós-Dramático. A publicação vem em boa hora, principalmente porque o livro de Hans-Thies Lehmann, que difundiu o termo, não está, ainda, traduzido para o português. Temos, portanto, mais elementos à mão sobre esse universo das artes cênicas enquanto não sai a tradução: o teatro pós-dramático. Segundo Sílvia Fernandes, este pode ser definido como um "teatro de intensidades, forças e pulsões de presença, que não está sujeito à lógica da representação".

Sobre o teatro pós-dramático, o número especial da revista traz os seguintes artigos:

- Subversão no palco - Sílvia Fernandes
- Ruptura conceitual e a influência no fazer teatral - Rosângela Patriota
- A pedra de toque - Luiz Fernando RamosO ator e a gusca - Márcio Aurélio Pires de Almeida
- Do texto ao contexto - Matteo BonfittoA linguagem do corpo - Soraia Maria Silva
- No palco, a luz - Cibele ForjazLaços Sonoros - Lívio Tragtenberg
- La fúria dels Baus e a violação do espaço cênico - Fernando Pinheiro Villar
- Sinais de teatro-escola - Maria Lúcia de Souza Barros Pupo

À nossa disposição, portanto, uma série de análises que podem contribuir para a compreensão desse universo de criação que é o pós-dramático;

Em tempo: tive acesso à revista pela mão de Fernando Villar, que me deu esse belo presente, quando, no dia 16/10/07, realizou a conferência Dramaturgias Híbridas no Projeto Laboratório: Textualidades cênicas contemporâneas, projeto da linha de ação Arte Expandida - experimentação nos Teatros Franciscon Nunes e Marília, realizado pela Prefeitura de Belo Horizonte, por meio da Fundação Municipal de Cultura/Diretoria de Teatros.

Villar apresentou um painel do universo de criação cênica que perpassa os campos do pós-dramático e da peformance art, que ele intitula justamente de Dramaturgias Híbridas. Ele remontou ao que chama, também, de "história da ação testemunhada pelo público", para caracterizar o sentido de performance num sentido amplo, não específico. Essa história teve o recorte conceitual desse campo que, para ele, sempre foi excluído das histórias oficiais do teatro - e que perpassa a performance art e pós-dramático.

Num primeiro lance, ele remonta às entradas das análise sobre esse campo de criação cênica, começando pelo livro de Roselle Goldberg, primeiro livro de Performance Art, lançado nos EUA em 1979, passando por Out of Actions: between performance and the object, de Paul Shimmell, em 1999, pelas análises de Josette Feral, que se refere à "morte de uma função anárquica" (fim das vanguardas históricas) e "surgimento de um novo gênero" (com as novas vanguardas), passando por contextos históricos e artísticos, desde Pollock, Cage, o grupo japonês Gutai, por Hiroschima e Nagazaki, entre outros acontecimentos. Depois, passou a apresentação dos grupos e artistas que configuram o universo configurado na junção da análise de Lehmann do teatro pós-dramático e das manifestações da performance art.

Por fim, Villar lembra que as Dramaturgias Híbridas são questões de uma live art: "arte ao vivo, arte da manipulação do eixo tempo-espaço, arte performática, arte da ação testemunhada, assistida, compartilhada..."



5.10.07

Improvisões - improvisação intermídia




O projeto Improvisões - improvisação intermídia no Teatro Marília - está no ar, com edital e tudo mais, sendo que as inscrições vão até o dia 30.11.07.

Improvisões é um projeto da Prefeitura de Belo Horizonte, por meio da Fundação Municipal de Cultura/Diretoria de Teatros, com foco na improvisação intermídia e no pensamento criativo. O projeto faz parte da ação Arte Expandida - experimentação nos Teatros Municipais. Em que o projeto inova? Improvisões permite que artistas de meios diversos e heterogêneos possam dialogar, ao vivo, diante do público, sem hierarquia.


São 04 apresentações de improvisação intermídia, realizadas no Teatro Marília. Para cada apresentação são selecionados, mediante edital, 03 artistas ou núcleos de criação (quando se trata de mais de um artista) caracterizados, cada um, como mídia do "corpo", da "imagem" e do "som", que irão, a partir disso, compor um Coletivo de Improvisação. Ao todo, participam das quatro apresentações 12 artistas ou núcleos.


Juntamente com as improvisações, são apresentadas performances conceituais, intituladas de Pensamento Disparado, realizadas por pensadores que se dedicam às questões de estética contemporânea.


O artista Marcelo Kraiser, um dos idealiazadores de Improvisões, escreve sobre o projeto:


"Improvisões: olhares e ações que surgem e se voltam para a improvisação inventando relações entre o corpo, a imagem e o som. O que queremos dizer com ‘invenção de relações’ ao invés de falarmos em ‘relações entre as artes’? Simplesmente que o que se improvisa são as relações entre os meios visuais, sonoros, linguagens verbais, artistas e técnicos que ocupam o espaço do teatro dentro e fora da caixa cênica devem ser compreendidas como trajetórias, linhas de ação e pensamento nas quais nada foi determinado com antecedência.

Os meios não são vistos nesse caso como aquilo que já foi catalogado como artes visuais, teatro, dança, performance, crítica e assim por diante e que sentados confortavelmente em seus territórios firmes iriam dialogar uns com os outros. Ao contrário disso, não concebemos os meios como lugares de passagem e nem como suportes, mas lugares muito instáveis, onde não fazem o menor sentido os opostos como teoria e prática, ruptura e continuísmo, antigo e contemporâneo pois neles não existem os controles das instituições do pensamento ou dos mercados das artes. O que não quer dizer um elogio do espontâneo e do vale tudo.


Esse lugar entre, como diz Gilles Deleuze, não é um local onde as coisas se relacionam uma com a outra, ‘ é o lugar onde as coisas adquirem velocidade... uma e outra, riacho sem início nem fim, que rói suas duas margens e adquire velocidade no meio’."


3.10.07

Interfaces entre a produção editorial e a produção cultural


Estarei na Semana da Produção Editorial e Talentos Editoriais, evento realizado pelo Uni-BH, discutindo a "Gestão de políticas públicas para a cultura - o desenho de projetos culturais: recorte, desenvolvimento e monitoramento - diálogos com a cidade." Farei uma exposição que terá por base, principalmente, minha experiência na direção do Centro de Cultura Belo Horizonte (1999-2004) e na Diretoria dos Teatros da Fundação Municipal de Cultura de Belo Horizonte (2005-).

A seguir, um texto da Coordenadora do Curso, Ludmilla Skrepchuk:


"O curso de Produção Editorial do Centro Universitário de Belo Horizonte- UNI-BH promoverá entre os dias 02 e 04 de outubro, no Auditório do Espaço de Convívio, do campus Diamantina, a partir das 19h, a Semana de Produção Editorial cujo tema será: "As interfaces entre a produção editorial e a produção cultural".
O evento tem o intuito de discutir a abrangência das possibilidades de atuação dos produtores editoriais no contexto das produções culturais e das manifestações artísticas, seja na grande indústria cultural ou em eventos e espetáculos alternativos ou subsidiados pelas leis de incentivo à cultura.
Na tentativa de promover a aproximação dos profissionais de produção editorial com as demandas e necessidade dos produtores artísticos e executivos, criando conexões entre o fazer do campo da editoração impressa, eletrônica e digital com a produção e divulgação de espetáculos e produções culturais nas mais diversas áreas: teatro, música, gastronomia, dança, enfim, o encontro da arte com as técnicas, tecnologias e teorias que perpassam o campo de atuação profissional dos produtores editoriais, numa perspectiva de complementariedade entre essas áreas.
Partimos do pressuposto de que nossa ferramenta fundamental é a formatação de produtos midiáticos e que todo e qualquer espetáculo prescinde da mídia para alcançar seu público. Sendo assim, o lugar da arte entrecruza-se com a editoração midiática."

21.9.07

Instant Composition: Momentum





















O projeto Momentum composição no instante – apresentou quatro performances improvisacionais no Teatro Francisco Nunes, nos dias 11, 12, 18 e 19 de setembro de 2007. A curadoria é de Dudude Herrmann, que escolheu, para cada dia, trios de bailarinos/performers que não estavam habituados a trabalharem entre si, para que realizassem composições no instante.

O Projeto da Prefeitura de Belo Horizonte/Fundação Municipal de Cultura/Diretoria de Teatros, faz parte da ação Arte Expandida – experimentação nos Teatros Municipais.

Dudude diz que o projeto é “um exercício pleno de desapego, em que improvisação, dança e composição estão, o tempo todo, se fazendo e desfazendo, em um constante devir de mundaças”. Os bailarinos/performers têm apenas uma tarde para se preparem, estabelecendo protocolos (negociações) de uso do espaço, equipamentos, iluminação, sonoplastia etc. À noite, diante do público, criam uma obra instável e permeada de riscos.

Na primeira noite(dia 11), Momentum apresentou Letícia Carneiro, Lívia Rangel e Lourenço Marques. Esse coletivo instaurou a platéia no palco, em arquibancadas (o que foi utilizado por todos os outros em seguida), definindo um espaço mais intimista (poltrona, mesa, toca discos), utilizando ainda as cordas de marinharia do teatro com suas maleguetas como fundo, a escada que vai para a varanda e urdimento. Houve uma escuta muito atenta entre eles, não só através de suas ações e desenhos corporais (sempre muito sóbrios), mas principalmente de suas musculaturas. Criou-se uma tensão entre os corpos, ocorrendo a construção de uma cena diante do público.

Na noite seguinte (dia 12), Marise Dinis, Margô Assis e Sérgio Penna. Os três partiram de uma série de elementos que solicitariam seus corpos: propostas de ação feitas por pessoas que enviaram mensagens eletrônicas etc. Os três envolveram também a platéia, sendo que algumas pessoas foram convidadas a improvisar com os três. A fragmentação da possível narrativa corpórea foi um dos recursos utilizados pelo grupo: ora um elemento entrava como texto a ser lido, ora uma tilha sonora, sempre produzindo interrupções. Trata-se de uma descontinuidade radical, produzindo cortes de fluxo, procurando, o tempo todo envolver o público como parte da paisagem de dança.

No dia 18, na terceira noite, Izabel Stewart, Carlos Arão e Thembi Rosa utilizaram as duas platéias (as arquibancadas no palco e a platéia de 55o lugares do Teatro Municipal). Utilizaram todo o espaço, com recortes de luz circulares, canhão de luz e sem trilha sonora. Intitularam de “árido, cru e seco” a intervenção/composição na platéia e palco do Teatro. Carlos Arão fez emergir uma corporeidade xamânica, de forte presença impactante, mas muito silenciosa e atenta. Thembi compunha uma partitura proposta inicialmente pelo seu marido, Canário, músico do Grivo. E Izabel, com um vestido imenso, mantinha-se aparecendo e desaparecendo dos focos, utilizando principalmente a platéia mais vazia do fundo do Teatro. Esse grupo explorou bastante o espaço, compondo com uma recusa em criar significações fechadas.

Por fim, no dia 19, Momentum encerra com Heloísa Domingues, Cristina Rangel e Paulo Azevedo. Os três começaram com utilização de objetos, simulando o espaço de uma academia de ginástica. O tema era o zero e seus desdobramentos. Utilizaram, ainda um microfone em cena. No final, uma bela surpresa: fazem entrar em cena um carrinho de pipoca e de algodão doce.

Momentum teve, a cada noite, um debate com o público, formado por artistas de dança e teatro e outros.

Sobre o projeto e os planos que ele instaura e convida a habitar, destaco:

  1. O que está em foco é a composição no instante (instant composition). Nesse procedimento, o que conta é justo a velocidade de compor no aqui-e-agora, diante do público. Um dos caminhos trilhados na dança improvisacional contemporânea exercita-se menos no não programado e mais na tentativa de incorporar a indeterminação, para lembrar John Cage. Aliás, Cage não acreditava em improvisação e, no entanto, a dança como performance improvisacional teve impulso a partir dele.
  2. Nesse procedimento (experimental) não há regras. As regras são inventadas enquanto se joga.
  3. isso não significa que não haja técnica. No entanto, técnica é um agenciamento maquínico (Deleuze e Guattari): desejo.
  4. Os artistas foram escolhidos pela curadora devido às suas habilidades – ou seja, porque dominam técnicas compositivas.
  5. Entre as técnicas de composição no instante, lembro o que chamamos comumente de “capacidade de escuta”. Para um procedimento técnico de criação que não se desenvolve por regras ou improvisação estruturada, esse é, com certeza o elemento mais importante. Alguns coletivos, em Momentum, tiveram em maior ou menor grau a capacidade de escuta. Conversando com Dudude Hermann, que vem estudando há anos procedimentos é técnicas de composição improvisacional em dança, a escuta é um farejar. Lembramos a criança quando brinca: uma faz um movimento, mantendo a sua ação, enquanto “fareja” o outro sem precisar de se relacionar diretamente com ele. Ou seja, sem ficar preso ao outro. Há diálogo físico, sensorial.
  6. Percebi na edição 2007 de Momentum dois tipos de escuta: a que se faz com a musculatura (com o tônus) e aquela que acontece com as imagens.
  7. A escuta é uma estratégia de silêncio. E o que é o silêncio senão um modo de se permitir que algo possa emergir no campo da percepção (emergência de campo)? Novamente, John Cage: o lugar no qual se dá a performance não é determinado (as estratégias de compor com os acasos).

Dudude Herrmann tem realizado um movimento avaliativo que permite focar a performance de dança improvisacional - suas estratégias, como a questão da escuta, seus "buracos" (lugares onde caimos no desespero de ficamos tentanto preencher o vazio) etc. Os artistas participantes têm feito propostas de aprofundar o projeto, de modo que o campo instaurado por Momentum possa produzir novas conexões.

Momentum deixa uma série de indagações. Os debates foram intensos, trazendo um frescor de idéias e sensações. Há uma coisa que tem a ver com um “espírito de época” nisso tudo. Não de modo datado - um movimento parado. Mais do que isso, a energia das pessoas que buscam, na crosta do planeta Terra, estratégias de sobrevivência. A incorporação do precário, do atravessamento (como sugere sempre a curadora Dudude Herrmann), enfim, de uma realidade em puro devir, faz parte desse espírito de época. O blog voltará ao tema.


Referências:

Imagens da Edição 2007 de Momentum: Glênio Campregher -

Para saber mais:


- A coreógrafa, pesquisadora e performer de dança improvisacional, Katie Duck discute no seu site (em inglês) procedimentos técnicos que interessam ao campo. Entre os temas, a distinção entre improvisação por escolha (choice) e por acaso (chance).
- Na Revista eletrônica Polêmica Imagem, n. 20 (Universidade do Estado do Rio de Janeiro), apresento algumas Anotações sobre teatro e experimento.
- Em Belo Horizonte, o Studio Dudude Herrmann realiza sempre cursos e conferências sobre improvisação e dança.
- Conexões entre as linhas de errância do brincar e o plano de experimentação abrem potencialidades. No blog sobe Cultura do Brincar fiz uma postagem intitulada justamente de Linhas de Errância, na abertura.

- Fernando Pinheiro Villar analisa uma performance de dança improvisacional. Leia em
Palavras em movimento: Nova Dança 4 e outros trânsitos. In: André Carreira; Fernando Pinheiro Villar; Guiomar de Grammont; Graciela Ravetti; Sara Rojo. (Org.). Mediações performáticas latino-americanas II. Belo Horizonte (MG): FALE/UFMG, 2004, v. 01, p. 145-164.

9.9.07

Trajetórias




Faço breves relatos de alguns encontros & possíveis. Em tempo: a imagem ao lado é do genial Nikola Tesla ao lado do seu mais famoso invento, o Tesla Coil) - uma imagem que sempre me inspira: quietude com o máximo de agitação e eletricidade.

Christina Machado, da Cia de Dança do Palácio das Artes convidou-me para um bate-bola de teatro físico. A Cia percorre ultimamanete as trilhas da experimentação, com foco no bailarino criador. Nos poucos encontros de três sessões, tenho buscado equacionar composição e improvisação. O teatro físico, como entendo: uma conjunção disjuntiva de estados corporais. Passagem das micro-sensações que percorrem o corpo do performer num diálogo (físico) com os outros corpos, objetos, espaço e tempo. Christina Machado busca com o grupo uma dança de fronteiras, como se pode perceber nos espetáculos recentemente encenados. O último trabalho intitula-se Transtorna e versa sobre as cidades, procurando reter sua fugidia realidade, sua fragmentação e partilha desigual. A Cia está se preparando para a próxima montagem, que deve ter a força dos coreógrafos Mário Nascimento e Sandro Borelli. Em Uberlândia (01 e 02/10) realizei uma oficina de improvisação em teatro físico na Escola Livre de Teatro do Grupo Pontapé. Foi muito bom conhecer o trabalho de Rubens e Kátia Bizinotto, que estão à frente do projeto. Os dois têm efetivamente promovido as culturas cênicas na cidade, produzindo e convidando espetáculos, oficinas, cursos permanentes de teatro, além de festivais, encontros etc. Na oficina procurei dar ênfase à clareza da composição corporal, elegendo algumas ferramentas, entre elas os Viewpoints, na trilha de Anne Bogart e Tina Landau, além da criação de seqüências de movimento configurando narrativas. Tiago Gambogi, do Grupo de Teatro Físico f.a.b. The Detonators, parceiro de Margareth Swallow, com sede em Londres, fez-me um convite-desafio: realizar uma consultoria, à distância, sobre o novo projeto de criação. ■ Ricardo Júnior, no seu auto-exílio para estudos cinematográficos na Argentina, convida para que escreva um artigo sobre o seu vídeo Material Bruto, com roteiro dele e de Byron O’Nell e direção de atores de Juliana Saúde. Material Bruto tem atuação da Cia Sapos & Afogados, um núcleo de usuários do sistema de saúde mental. O vídeo ganhou o prêmio do júri no Festival de Curtas de BH em 2007. Por fim, o Olho-de-Corvo volta à pesquisa, num Coletivo de Criação: Vim buscar sua alma (nome provisório que poderá vir a ser definitivo). Trata-se de uma criação que se desdobra em duas etapas: um vídeo em parceria com Byron O’Nell, contando com a participação de Alex de Castro, Davi Pantuzza, Jéssica Azevedo, Paulo Rocha, Naiara Jardim e Sara Vaz. Ricardo Júnior, da Argentina, dialoga com a pesquisa, lançando perguntas, propondo filmes. Aliás, a primeira etapa foi a realização de estudos sobre narrativas cinematográficas que chamo de disjuntivas, e os teatros pós-dramáticos: elegemos prioritariamente Godard, Glauber (assistimos, além destes, muitos outros) e o Teatro de Tadeusz Kantor, Zikzira Physical Theater e DV-8 Physical Theater. Depois passamos a circundar o universo da linguagem e da temática, lendo quadrinhos (Sanctuary entre outros), Cidades Invisíveis de Ítalo Calvino, textos de Deleuze e Foucault e filmes de Tsai Ming Liang e Kar Wai Wong, especialmente recomendados pelo nosso correspondente em Buenos Ayres, Ricardo Júnior. Foi um curso informal, mas muito fecundo, com ênfase nas narrativas disjuntivas. A segunda etapa será uma performance que irá focar a geografia intensiva da cidade, tendo como ponto de partida os elementos acionados no vídeo. Nessa etapa, outros performers e artistas serão convidados a entrar no jogo. O que falta: conseguir um espaço para ensaio, organizar o material e apresentar para uma empresa produtora. E, então, deixar que o delírio e a sobriedade possam entrar num acordo precário.

19.8.07

Seminário do Projeto Laboratório: textualidades cênicas contemporâneas



Promovido pela Prefeitura de Belo Horizonte, através da Fundação Municipal de Cultura/Diretoria de Teatros, com curadoria de Fernando Mencarelli e Nina Caetano, o projeto Laboratório: Textualidades Cênicas Contemporâneas cumpriu sua primeira etapa, a realização de um seminário com especialistas da área, focando os teatros pós-dramáticos, a cenas hibridas, as interlinguagens e as dramaturgias da cena. A segunda etapa inicia-se com pesquisas e oficinas nos espaços do Teatro Francisco Nunes, com apresentações artísticas em novembro de 2007.

No dia 18/08, Luiz Fernando Ramos, encenador, dramaturgo, crítico e documentarista, professor da USP, falou sobre Mimese, estética e cena contemporânea. Ele começou apresentando o conceito de mímese numa perspectiva filosófica. A mímese, que difere da diegese, por ser a primeira uma narrativa direta sem mediação e a segunda uma narrativa indireta, quando alguém diz de algo para outro alguém, era tomada por
Platão como imitação de uma imitação. Já que o mundo sensível é uma cópia das idéias originais, a mímese dos artistas era, portanto, uma cópia da cópia. E, por conseguinte, sem valor para a educação da juventude.

Já em
Aristóteles, prossegue Luiz Fernando, o poeta - o fazedor de mundos - ocupa um lugar diverso. Em vez de ser desvalorizada, a mímese favorece o aprendizado. A catarse que ela provoca, em termos de piedade e pavor, colocaria as pessoas da cidade em contato com suas próprias realidades, diria, projetadas à sua frente. A mímese em Aristóteles tem a ver com a potência de reprodução da vida - o verossímel. E não com o conceito de adequação, como seria posta pelos neo-clássicos, no século XVII. Como tekné, a arte é uma capacidade igual a da natureza, que o poeta, portanto, domina. A mímese, surge, assim, numa ambivalência: de um lado, tomada como cópia, do outro, tomada como capacidade produtiva.

Ramos, então, passa a focar o pensamento de
Kant, para o qual a arte deixa de possuir um sentido finalista, tornando-se um jogo livre entre imaginação e entendimento. Torna-se, assim, livre das regras neoclássicas, que haviam capturado a mímese como adequação com uma realidade. O conferencista passa por Wagner e Nietzsche, apontando, por fim, para o movimento anti-mimético e anti-teatral, que irá caracterizar o século 2o. Para Luiz Fernando, esse movimento será basicamente anti-teatral, no sentido de colocar em crise a representação. Artaud, por exemplo, diria que se trata não mais de repetir a vida (o que faria o conceito de mímese como imitação), mas de reinventá-la (o que poderia, sob outra visada, ter a ver com mimese como produção de vida). O que Luiz Fernando conecta imediatamente com Brecht, por outra via: o social como invenção e a cena intervém na produção dessa re-invenção.

Luiz Fernando Ramos abordou, ainda,
Beckett, que seria um artista emblemático da crise da representação. Perpassa, então, por toda uma gama de artistas que questionam o estatuto da imitação, chegando a discutir A encenação que Henrique Diaz fez de A Gaivota, recentemente no Brasil (2007). Nesse espetáculo, os procedimentos de construção da personagem, que deveriam ficar de fora, fazendo parte somente do processo, entram no resultado, na cena. E, antes de tudo, influenciam na narrativa. Ou seja, tornam-se narrativa. Aqui, ocorreria, segundo Ramos, uma cena fracassada (que não se completa, numa visão positiva) aguçando a crise da representação. A mímese, entendida como potência de vida e não como adequação do objeto a uma verdade ou realidade que lhe é exterior, pode ser, nas trilhas traçadas por Luiz Fernando Ramos, um modo de ver a crise da representação.

No dia 14, seria a conferência de Fernando Villar, autor, diretor, ecenador e ator, lecionando na UnB, que falaria sobre sobre as Dramaturgias Híbridas. Infelizmente, Villar ficou impedido de vir por causa de um pequeno acidente, antes de sair de Brasília. Foi acertado, então, sua vinda no dia 10 de setembro, a fim de as pessoas possam partilhar de sua apresentação sobre o tema.

Nesse dia, o curador Fernando Mencarelli, para que as pessoas não perdessem a viagem, apresentou um vídeo sobre Tadeuzs Kantor, A Classe Morta, e um trecho de The Dead Dream of Monocleone Man, do grupo de Teatro Físico inglês,
DV-8. Discutiu-se as especificidades dessas narrativas e suas relações com a análise que Lehmann faz do que ele denomina teatro pós-dramático.

Dia 15 foi a vez de Christine Greiner, que abordou a Reinvenção do Corpo no Japão do pós-guerra. Greiner exibiu imagens de quatro experiências corpóreas sobre a mulher na cena janonesa: a mulher/atriz no Teatro Nô, o homem que faz o papel de mulher no Kabuki,
Hijikata com a performance intitulada A Menina e um Anime, no qual o corpo da mulher se camufla com o ambiente. Christine Greiner avança sobre a noção de impermanência na cultura japonesa, abordando especificamente a cena do pós-guerra. A recusa de Hijikata, quanto ao corpo samurai, assim como em relação ao corpo nacional e, ainda, aos modelos ocidentais, é apresentada por Greiner e discutida mais demoradamente: um corpo precário - um corpo cadáver. O contexto da cultura japonesa do pós-guerra teria, segundo Greiner, impulsionado nessa direção: o Imperador é obrigado a renunciar como ser divino e assumir sua condição humana. A idealização dos corpos que vimos no Nô e no Kabuki depara-se com outro plano corpóreo: corroído e atravessado por todo tipo de forças. Vendo a projeção em vídeo da performance de Hijikata pude sentir o que Deleuze e Guattari entendem por Corpo sem Órgãos.

O público, composto por artistas de dança, teatro, performance e outras áreas, discutiu muito, também, a modernização do Japão, a questão das identidades culturais, voltando, ainda, às informações sobre o estado da arte da cena vanguardista japonesa.

No dia 16, Houve a mesa redonda com a presença dos criadores da cena contemporânea belo-horizontina. Falaram Inês Kinke, artista plástica e criadora cênica, Ione Medeiros, do Grupo Oficcina Multimédia, Tarcísio Ramos e Gabriela Christófaro, bailarinos-criadores. A mediação foi dos curadores Fernando Mencarelli e Nina Caetano.

Ione Medeiros expos um breve histórico do Grupo Oficcina Multimédia, sua origem , sua criação nos anos 70 pelo músico Rufo Herrera, como um grupo de pesquisa da Fundação de Educação Artística, liderada esta pela musicista Berenice Menegalle. Traçou as suas influências e motivações estéticas que levaram à criação de uma cena outra: os procedimentos sincréticos (eliminação de toda informação supérflua, ilustrando-o com o desenho do Touro de Picasso), de distorção, como é o caso da caricatura, e de assimetria (exemplificando com a escultura de Alber Giacometti). Ione ainda falou da ruptura com a visão tradicional da personagem no drama teatral, apresentando, no seu lugar, festos e movimentos que ampliam o foco, além do desenvolvimento de funções práticas na cena (carregar coisas etc.), passando pela música e pelo ruído como elementos dispostos não hierarquicamente, juntamente com a imagem, o texto falado e os objetos. Trata-se, como ela disse, da criação de uma tessitura interdisciplinar.

Tarcísio e Gabriela falaram desse lugar fronteiriço entre teatro e dança, na busca por uma dramaturgia da dança. Tarcísio enfatizou as seguintes linhas de abordagem da questão: a) a dramaturgia do corpo do bailarino; b) a dramaturgia da cena; c) a da cena como pontos estruturados em conexões com os demais elementos; c) a dramaturgia de fundo, como sendo o inconsciente do espetáculo, com seus silêncios e pausas e a dramaturgia que, se não me engano, refere-se ao que está sendo feito diante do público.

Inês Link, uma artista plástica alemã que vive em Belo Horizonte, explorou sua conexão com as artes cênicas a partir das questões relativas à instalação. Sua questão ou pergunta: como o espaço pode afetar fisicamente os atores. Para ela, trata-se de saber como as materialidades influenciam os atores na criação. Ela procura convidar o público a adentrar no jogo cênico tomando, para tal, uma composição cênica que trabalha com a justaposição de realidades heterogêneas. Um pensamento de criação que passa por uma nova percepção da realidade. Além disso, Inês expõs suas pesquisas em que pensa a cidade de modo cenográfico: ocupações, instalações, percursos etc.

Laboratório é o nome desse projeto. A segunda parte vem com as oficinas de Antônio Araújo e Fernanda Lippi para os Núcleos de Criação, com apresentações artísticas em Novembro de 2007.

Para saber mais:
Sobre Buto:
Vídeos sobre performances de Hijikatta no YouTube
BOGÉA, Inês (ed.) e Luisi, Emidio (fotos) Kazuo Ohno. São Paulo: Cosac&Naify, 2002.
GREINER, Christine. Butô - Pensamento em Evolução. São Paulo: Escrituras, 1998.

BAIOCCHI, Maura. Butoh - Dança Veredas D'Alma. São Paulo: Palas Athena, 1995.

Sobre Teatro Pós-dramático:

LEHMANN, Hans-Thies. Postdramatic Theatre. New York: Routledge, 2005.
COHEN, Renato. Working in progress na cena contemporânea. São Paulo: Perspectiva, 1998.

Sobre a retomada do conceito de Mímeses:
COSTA LIMA, Luiz. Mímesis e modernidade: formas das sombras. RJ: Graal Editora, 1980.

1.8.07

De Fast para Slow Food




Quando entro num fast food e a pessoa me diz que o pedido ficará pronto em 2 minutos, eu entro em pânico. Primeiro, porque aqueles rapazes e moças ficam correndo para um lado e para o outro numa dança infernal, sem sentido. Depois, porque uma comida desse tipo deve ser muito esquisita. Passei, então, a evitar esses lugares, não só por questão da comida mesma, mas por uma recusa ideológica do tipo de trabalho, no mínimo estressante, a que as pessoas estão sendo submetidas. Uma micro-política deveria, também, dar conta de pensar essa dança esquisita dos fastfoods e as conexões que gera no nosso eco-sistema interno e externo. E, além disso, pensar a estética de um mundo cujos alimentos são produzidos em escala industrial.

Por tudo isso, recebi com alegria, através de mensagem de Marcelo Terça-Nada, a notícia do web-design criado por ele e Cia. para um site superbacana: o Slow Food do Brasil. Há toda uma gama de informações e conexões sobre uma realidade possível, de pequenos produtores, de consumo curtido (expressão que vem de curtir o couro, de sofrer a ação do tempo). Vale a pena conferir o site, com muito conteúdo de sobra, para ser lido e revisto vagarosamente.

O psicanalista Célio Garcia, num seminário sobre Lacan e a Cultura, realizado no Centro de Cultura Belo Horizonte, com curadoria de Cristiane Barreto, dizia que o tempo lento é o tempo dos pobres, numa alusão ao geógrafo Milton Santos. Pedi que ele falasse mais um pouco sobre isso, pois eu estava numa descoberta pessoal, em termos de treimanento e criação corpórea, com o slow motion. Célio me disse que, na época da ditadura militar, ele e muitos outros exilados, trabalhavam na França selando cartas no serviço de Correios. Os ocidentais, dizia Célio, acostumados à escala industrial e hiperprodutiva, realizavam o trabalho com muita pressa, carta após carta. Já os africanos, dizia Célio Garcia, faziam aquilo com uma lentidão impressionante. Não havia motivo para correr. E nenhuma necessidade. Os gestos de Célio imitando os africanos eram fantásticos: passar a cola, passar a mão na carta, deixá-la num monte, para depois cruzar os braços, fazendo uma expressão de pausa que era, na verdade, de uma grande recusa. Somente depois disso, passavam para a outra carta.

Micro-políticas alternam velocidades e lentidões (Deleuze e Guattari) de um modo tático, de acordo com o momento, desobstruindo vias de desejo, evitando confrontos esmagadores, criando zonas de autonomia.

21.7.07

Arte e acidente






A obra de arte funcionou durante alguns séculos como algo oposto, complementar ou compensatório em relação à vida - e à toda a sua instabilidade. Assim, a arte elevaria o acidente do mundo
sensível a um grau de conhecimento superior. A conexão arte-acidente me vem à mente quando fico sabendo do desastre aéreo no Aeroporto de Congonhas, que matou mais de duzentas pessoas. O que nos acontece quando recebemos as imagens e os comentários na mídia do acidente aéreo ocorrido em Congonhas? Independentemente das responsabilidades a serem apuradas, há um misto de confusão, revolta, medo, insegurança... Há um lance de desordem que nos atinge: ficam nossas conclusões suspensas. Depois, isso volta rapidamente a uma estabilização. As emoções, a vontade de saber as causas, tudo no remete de volta ao nosso mundo aparentemente seguro. Compramos jornais, conversamos sobre o assunto... No entanto, a incerteza continua operando à nossa revelia. Listo, a seguir, algumas atitudes em relação à conexão arte-acidente:

1. Paul Virilio nos diz que a arte, hoje, é acidente. Este é
justamente o título de uma de suas obras, juntamente com Sykvère Lotinger: The Accidente of Art. No entanto, a arte, ela mesma, ainda, não se deu conta desse fato. Mas é um acidente total, uma catástrofe. No entanto, Virilio diz que não acredita nas teorias do caos. O "mundo insano que abraçamos" não é algo nem positivo e nem negativo. Mas ele desorienta os sentidos. E, por isso, Virilio não acredita numa teoria do caos: isso é lixo, diz ele. "Nós não podemos viver sem um foco e um sistema regulador de nossas sensações". Conhecimento é acidente. E arte é um modo de conhecer. Então, diz Virilio em outro texto: "Não há ganho sem uma correspondente perda. Ao inventar a substância é indiretamente inventado o acidente, então, quanto mais poderosa e eficiente a invenção, tanto mais dramático o acidente." Virillio mostra como ciência, arte, guerra e acidente estão mutuamente implicados no mundo contemporâneo.

Em The accident of art, Virillio diz que "nós entramos num período de acidente total: tudo se danifica no acidente. O conhecimento tem sido mortalmente mutilado. Isso não é o apocalipse, esqueça isso. Não é uma catástrofe no
sentido de que tudo vai parar (...). Não, tudo o que constitui o mundo tem sido experimentado num acidente., e sem exceção."


2. Anne Bogart, criadora de um novo teatro norte-americano, no seu mais recente livro, And then, you act - making art an unpredictable world, no contexto do 11 de novembro, nos diz que, nessas circunstâncias, nossas certezas falham. Nesse momento surge um vazio potencial: podemos mudar o modo de uma onda perversa de patriotismo e mais guerra.

Para Bogart, deveríamos inventar novos modos de ver a vida. Ela cita o ensinamento budista que sugere ser a vida uma arte de adaptação. O trabalho de arte, pergunta ela, não seria, então, de tipo de adaptações necessárias à vida? Em face da adversidade, a arte nos daria a necessária coragem e energia. Anne Bogart cita o compositor Leonard Bernstein, para o qual, "a resposta de um músico à violência é tornar a música mais intensa". A arte, lembra Bogart a partir de um poeta africano, é um meio de preservar as fontes de água de um povo no meio do deserto.

3. Numa outra postagem, intitulada de Improvisação e Experimentação, de Cage a kandinsky, abordo o tema da incerteza na perspectiva da indeterminação na criação cênica. O tema está aberto: a questão da arte contemporânea não está tanto em tematizar a instabiidade, mas em incorporá-la no seu processo.

4.
Ann Cooper Albright (2003) coreógrafa e pesquisadora de dança contemporânea nos EUA, quando soube do ataque às torres em Nova York, respondeu à incerteza com uma improvisação. No dia seguinte ao ataque, relata a coreógrafa, as pessoas haviam percebido que habitavam um mundo diferente. Ela reuniu sua classe de estudantes no Oberlin College e, juntos, sentiram a necessidade de atuar com essa nova realidade que se abria no buraco das duas torres, através de uma improvisação no campus. A coreógrafa e pesquisadora de dança vê na improvisação a “habilidade em responder diferentemente” às mudanças, quebrando padrões de comportamento, trazendo a atenção para o momento de suspensão entre pontos de referência. Um espaço que permitiria a modificação das respostas habituais. Para ela, é o que necessitamos, tanto estética quanto socialmente, neste século XXI: uma physical awareness como um estado mental sutil, no qual há um engajamento corporal e em que improvisamos a partir de nossa própria experiência. Nesse aspecto, Albright vê a improvisação como uma filosofia de vida, não em termos de um sistema de crenças ou doutrina, mas sim como meio de relacionar movimento e experiência, na modalidade de um engajamento somático com o mundo, superando assim as oposições mente-corpo.


Referências:
VIRILLIO, Paul and LOTRINGER, Sylvère. The accidente of art. Translatede by Michael Taormina. Semiotext(e), Columbia University, NY, 2005.

BOGART, Anne. And then, you act - making art in an unpredictabel world. Routledge, N.Y, 2007.

GERE, David. Introduction. In: ALBRIGHT, Ann Cooper e GERE, David (editors).Taken by surprise: a dance improvisation reader. 2003: Wesleyan University Press, Middletown, EUA.